Fotografia e os anos 60. Cenas de uma década rebelde – o olhar corajoso de uma geração

Fotografia e os anos 60. Cenas de uma década rebelde – o olhar corajoso de uma geração

Moracy R. Oliveira

Como o rock, o movimento hippie, as drogas e todo um extenso elenco de subculturas que ganharam evidência, também a fotografia pôs o pé na estrada nos Estados Unidos e Europa durante os anos 60. Influenciada pelas grandes reportagens das revistas ilustradas como Life e Look, ela abandonou a obscuridade dos clubes de amadores e ganhou as ruas acompanhando os gestos de revolta como instrumento de registro do olhar corajoso que as novas gerações dirigiam ao cotidiano, na tentativa de desmascarar o falso humanismo que ainda o encobria, apesar da guerra fria, do Vietnã e da violência generalizada por todo o planeta. No Brasil, esse tipo de fotografia só chegou na década seguinte, através de jovens universitários e de representantes de uma classe média emergente. Mas, ainda durante os anos 60, alguns ecos já desembarcaram por aqui, como evidencia a pequena exposição organizada pela Fotóptica e o MAC.

Tímida, incompleta e visivelmente preguiçosa, ainda assim ela vale como lembrança de uma década em que, principalmente em seu final, com a equipe da revista Realidade, a fotografia promove um grande encontro com o país, através das reportagens fotográficas sobre regiões, grupos sociais e econômicos e comportamentos que a TV ainda não tinha banalizado aos olhos públicos. As fotos em exposição servem de painel para os contrastes brasileiros de então. Nas rápidas pinceladas que ela dedica a autores como Maureen Bisilliat, Henrique Macedo Neto, Luis Humberto, Sérgio Jorge, Otto Stupakoff, também se delineiam os contornos de enfoques mais introspectivos. O exemplo maior é o de Boris Kossoy, transformado no livro Viagem pelo Fantástico, onde a realidade cede lugar a imagens surrealistas e aos tons sombrios de uma viagem interior, revelando sintomas de que outras mudanças também se processavam jun to com as transformações do cotidiano.

Mas o que esta pequena mostra deixa claro é que, embora profundamente diferente das matrizes americanas e européias da época, a fotografia dos anos 60 no Brasil também passou por mudanças. Ela foi menos outsider, mas nem por isso deixou de lado uma tendência comum: a de se aproximar do real não só com curiosidade mas também com um agudo sentido crítico.

OLIVEIRA, Moracy R. Fotografia e os anos 60. Cenas de uma década rebelde – o olhar corajoso de uma geração. São Paulo, ISTO É, 23 jan 1985.

 



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